Descrição
Sempre foi assim. Igual, somente na intensidade com que procura desvelar o novo. Chega muito perto: risca, grava, modela, raspa, pinta, apaga. Procura as passagens mais sutis entre o relevo que salta do suporte e o azul de profundidades maiores. Tem rigores de um gráfico. tem posturas de um trabalhador atento. Faz a paginação do impossível: explica, pela caligrafia rigorosa, as leis da beleza inexplicável do corpo humano, que não é só corpo mas é ser que está em tudo mais que o rodeia. Faz das ambiguidaddes, belezas; das belezas, amarguras; sonhos de criança. Barcos, barquinhos, bandeirolas dos homens e meninos que são seus. Colagens fantásticas de seres e coisas que vêm de muitas partes. E estão juntas porque alguém quis. A colagem traz fragmentos de outros universos. Não estão ali pelo ajuntamento arbitrário que gera o monstruoso, apesar de estarem encostadas umas às outras, sem uma linha mestra que se evidencie. Há uma incansável procura de solidariedade. E a sensibilidade inteligente, que tudo unifica, permite, pela arte, o encontro num espaço nunca visto e jamais sentido. A mais delicada das cores, o traço mais sensível, um fragmento de tecido, de papel ou de muro, tudo pousa ali como se estivesse à espera de ser visto. Até o pássaro ferido. emerge o amor inesperado, a vida inesperada, a dor da beleza. Sempre foi assim, como se se defrontasse com caminhos infindáveis. Já os primeiros desenhos que vimos em 1952, eram de personagens perdidos na noite de uma cidade triste. Mas sempre foi assim, pela sua obra, pelo seu trbalho, um artista que queremos merecer. - Flávio Motta. Apresentação. In: FERRO, Sérgio. Michelangelo; notas por S. Ferro. São Paulo. Palavra e Imagem, 1981. p. 7-8.